O gênero giallo ("amarelo" em italiano), popular entre os anos 1960 e 1980, é considerado por muitos estudiosos do cinema como um precursor dos filmes slashers estadunidenses na medida em que mistura elementos do terror e do mistério para apresentar assassinos em série e mortes extravagantes. O nome dessa categoria cinematográfica remonta às publicações literárias italianas do início da década de 1930, período em que a Editora Mondadori divulgou, em capas amarelas, uma série de traduções das obras de Agatha Christie, Arthur Conan Doyle e outros renomados escritores. Com o sucesso da iniciativa, outras editoras passaram a identificar livros pertencentes ao mistério e ao horror com capas amarelas, o que posteriormente motivou adaptações cinematográficas das obras que preservaram o nome giallo. O filme italiano Terror na Ópera, de 1987, em que pese não adaptar nenhuma obra literária diretamente, foi influenciado por O Fantasma da Ópera, de Gaston Leroux, e por decepções pessoais na vida do diretor. Além do estilo inconfundível do diretor e das cenas visualmente marcantes, o filme é digno de recomendação por demonstrar na prática o sucesso da mistura de influências literárias e pessoais no cinema de horror.
No final dos anos 1980, o renomado cineasta italiano Dario Argento foi convidado para dirigir uma adaptação teatral da célebre ópera Macbeth, composta em 1847 por Giuseppe Verdi. Infelizmente, porém, a produção não fluiu como o esperado e o projeto fracassou. Contudo, a experiência pessoal negativa motivou o diretor a escrever, ao lado do roteirista Franco Ferrini, a trama de um ousado filme: Terror na Ópera.
No filme, Marco (Ian Charleson) é um diretor de cinema que organiza a adaptação da ópera Macbeth no renomado Teatro Regio quando recebe a notícia de que a estrela da obra, Mara Cecova, foi atingida por um carro. Rapidamente, o cineasta convoca uma nova atriz para o papel, a jovem e inexperiente Betty (Cristina Marsillach). No início, Betty tenta recusar a oportunidade por temer a maldição de Macbeth, espécie de lenda sobre eventos negativos associados aos participantes da dramatização de Macbeth. Contudo, a estreia ocorre normalmente e é um estrondoso sucesso, até que incidentes estranhos e perturbadores começam a atingir o elenco e a comprovar a temida maldição relacionada à peça. Um assassino em série persegue a atriz principal e a obriga a presenciar alguns de seus assassinatos, com um método inspirado por uma piada do próprio Argento.
Na cena, talvez a mais famosa do filme, Betty é imobilizada e torturada com o curioso método: o assassino posiciona alfinetes adesivados embaixo dos olhos da cantora lírica. Portanto, qualquer tentativa de desviar o olhar ou de fechar os olhos implicaria em uma perfuração tenebrosa. A ideia surgiu de uma piada do diretor, já que, insatisfeito com os espectadores que afastam o rosto durante as cenas mais violentas de seus filmes, sugeriu grudar alfinetes em seus olhos para inviabilizar a reação.
Além da clara relação entre o recente histórico profissional de Dario Argento e do personagem Marco, é visível que a sinopse do filme, bem como a ambientação e o argumento principal, recebeu influência do clássico gótico O Fantasma da Ópera. Escrito por Gaston Leroux e publicado no ano de 1910, o livro francês revela a história da jovem soprano Christine Daaé, subitamente convocada para substituir a experiente Carlotta na Opéra Garnier após o adoecimento da cantora principal. Christine é orientada por um ser misterioso que inicia uma verdadeira perseguição a qualquer pessoa que tente afastar a jovem do estrelato, o que colabora para uma crença generalizada em um fantasma que assombra o teatro lírico francês. Portanto, é possível estabelecer paralelos entre Betty e Christine, Teatro Regio e Ópera Garnier, a maldição da ópera Macbeth e do fantasma francês, entre tantos outros.
Durante a produção de Terror na Ópera, a equipe criativa enfrentou tantas situações inesperadas que a maldição de Macbeth, até então uma referência ficcional, parecia realmente existir. Entre todos os incidentes relatados, alguns são dignos de menção. A atriz Vanessa Redgrave desistiu do papel de Mara Cecova pouco tempo antes das filmagens e provocou sérias mudanças na quantidade de cenas da personagem; o ator Ian Charleson sofreu um acidente de carro e descobriu que era soropositivo; a atriz Daria Nicolodi, grande colaboradora do diretor, quase abandonou o papel; e o pai de Argento faleceu durante as filmagens.
Após todas essas considerações sobre as inspirações de Argento para organizar o clássico Terror na Ópera, é impossível não recomendá-lo. O filme de Dario Argento é uma obra autoral, inovadora e divertida que marcou o período em que foi lançada e continua a provocar nos dias atuais. Tudo leva a concluir que a verdadeira maldição de Macbeth é ignorar o longa-metragem.
Referências
- Terror na Ópera (IMDB)
- Terror na Ópera (1987), de Dario Argento (Cineplot)
- “Opera”: Dario Argento, o dispositivo do olhar (À pala de Walsh)
que interessante, só conhecia o giallo pela literatura!
ResponderExcluir