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Dennis Rader: de líder religioso a BTK

Obras sombrias despertam a curiosidade das pessoas, pois elas podem mergulhar a fundo em um lado próprio com o qual apenas flertam, mas vivem no imaginário. Contudo, o subgênero true crime traz consigo as mais diversas pautas reais que, ainda assim, mantém o público vidrado. A curiosidade humana pelo macabro não é algo recente, desde os panfletos sensacionalistas de séculos atrás até os dias de hoje, a morte foi sempre um atrativo do espetáculo. 

E não apenas nós, leitores, sabemos disso, como também os perpetradores. Nessa categoria, há um em específico que se alimenta da fama, dos holofotes, da repercussão que seus casos ganham: sim, estamos falando dos serial killers (assassinos em série). Primordialmente, o FBI apenas dava essa alcunha para aqueles que tivessem matado, no mínimo, quatro pessoas. O número eventualmente caiu para três. Um dos exemplos mais notórios da categoria é um assassino que este esteve na ativa por trinta anos. É provável que você já tenha ouvido falar dele: B.T.K. Mas quem era o B.T.K.? 

Dennis Lynn Rader era alguém que podia se passar por um cidadão comum, e ele o fez. Foi escoteiro, casou-se, teve filhos, e ainda foi presidente de uma congregação local. Ninguém poderia desconfiar que esse mesmo homem, que atendeu a aeronáutica dos Estados Unidos e viajou pela Coreia do Sul, Turquia, Grécia e Japão, era aquele fazendo as mulheres de Wichita perderem o sono à noite. No livro BTK Profile: Máscara da Maldade, conhecemos os detalhes de sua história, que a editora DarkSide publicou no Brasil. 

Desde a densidade das páginas até o trabalho de arte, o livro é uma obra que vale a pena adquirir tanto pelo conteúdo quanto pelo cuidado nele depositado. Escrito por Roy Wenzl, Tim Potter, Hurst Lavianna e L. Kelly, as linhas fluem ao estilo de jornalismo literário, escolhendo uma abordagem de rota de colisão: de um lado, acompanhamos a contínua escala dos crimes cometidos por Rader; do outro, vemos o departamento de Polícia de Wichita e o FBI trabalhando num dos casos mais difíceis que já haviam enfrentado. 

O BTK: Dennis Lynn Rader

Dennis nasceu em 1945 e era um homem metódico, não apenas em suas execuções como em sua própria casa. Sua esposa vivia com horários, e tinha de manter tudo organizado para o marido. Sempre “na hora certa”. Sua mania por organização rapidamente foi transferida para o método de execução, onde derramava o mínimo de sangue possível e ainda tomava seu tempo para colocar suas vítimas em posições pós morte que agradassem suas fantasias. 

Assim como outros assassinos, ele fez sua tarefa de casa. Estudou livros policiais, métodos de investigação, e, o seu predileto, pornografia. Em muitos sentidos, ele não se diferenciava de outros nomes famosos: gostava de colecionar os conhecidos troféus das vítimas e usá-los na luz do dia. Exibia o relógio do pai dos Otero, a família que foi seu primeiro contato com algo tão brutal, como se fosse um souvenir adquirido por ele mesmo. Os Otero foram, de acordo com depoimentos, o primeiro "grande ato" de Dennis; e, como todo novato, ele cometeu erros. Não sabia da presença do pai na casa, teve de voltar para buscar a faca do assassinato, e deixou impressões digitais. Estava crente que a polícia viria atrás dele. Mas ela nunca veio. Isso o incentivou e, assim, continuou suas "pesquisas".

Aprofundando ainda mais seu estudo de caso, ele frequentou aulas de administração do sistema judicial; queria conhecer o que acontecia por dentro. E foi nesse período em que iniciou um diário, ou melhor, um fichário para escrever sobre o pensamento de suas vítimas. É nesse fichário que consta a primeira assinatura B.T.K. (bind, torture, kill - amarrar, torturar, matar, em tradução livre) - seu modus operandi. O amarrar e o sufocar eram definitivamente as partes favoritas do homicida. O livro BTK Profile: Máscara da Maldade não deixa detalhes de lado e nos fornece informações encontradas tanto nos fichários quanto no depoimento de trinta horas que ele prestou para a polícia em sua confissão. Ele chamava suas vítimas em potencial de Projetos (PJs), e era guiado por seus próprios instintos sexuais e pela vulnerabilidade de mulheres. As chances de satisfazer a suas vontades eram maiores quando alguma mulher vivia só e mantinha uma rotina regrada. Sua ousadia e arrogância eram tamanhas que deixava, por vezes, fichas com seus "Projetos" em sua sala de trabalho, certo de que ninguém ousaria mexer em algo que era seu.

Sua primeira chacina foi o assassinato da família Otero. Joseph Otero, 38 anos; Julie Otero, 33 anos; Joseph Otero Jr, 9 anos e Josephine Otero, 11 anos - todos vítimas do BTK. Passou semanas espiando as mulheres de casa ao trabalho. Após os assassinatos, sentiu que estava pronto. 

Nesse momento, o livro faz um balanço com certa sensibilidade, trazendo o ponto de vista das vítimas, ainda que seja baseado em suposições e depoimentos de amigos e parentes sobre suas personalidades. Há também as descrições do próprio Rader que, quando finalmente preso, desatou a falar. É importante que o leitor possa humanizar e dar nome não apenas àquele que cometeu os crimes, mas também às suas vítimas: Kathryn Bright (21), Shirley Relford (24), Nancy Fox (25), Marine Hedge (53), Vicky Wegerle (28) e Dolores Davis (62). Kevin Bright e Anna Williams foram os únicos que conseguiram escapar de seus destinos trágicos.  

"Não era fácil matar, as vítimas acordam depois do estrangulamento, fazendo com que usasse os sacos plásticos para o sufocamento.”
 Na contramão de predadores sexuais necrófilos, sua satisfação vinha durante o processo de sufocamento e por sentir a vida esvaindo-se em suas mãos. Esse era o seu prazer. A consciência do poder, de sentir-se, talvez, um Deus. Outras manias do serial killer incluíam vestir-se como as vítimas e tirar selfies vestido com elas, fazendo uma coleção das suas vítimas em revistas em um período intercalado entre os assassinatos. Matou em 1974, 1974, 1985, 1986 e 1991. 

As cartas do BTK 

Uma das sobreviventes, Anna Williams, viúva de 63 anos, havia acabado de chegar em casa quando encontrou a porta do quarto de hóspedes aberta. Roubaram joias, roupas, e uma meia. Ela fugiu de casa quando notou que sua linha telefônica estava muda. Semanas depois, Anna recebeu uma das mais famosas cartas de B.T.K.: dentro dela, havia um desenho, uma de suas joias e echarpes. Segue a reprodução da carta:

"oh, anna, por que você não apareceu
Foi um plano perfeito de prazer pervertido tão
audacioso naquela noite de primavera
Meu sentimento interno ardendo com a
propensão da nova estação que despertava
Quente, úmido, com medo e êxtase internos, meu prazer
de enredamento, como novas vinhas tão apertadas.
Oh, A - Por Que Você Não Apareceu
Gota de medo fresca da chuva primaveril rolaria por sua
nudez para perfumar a febre intensa que arde por dentro.
Naquele pequeno mundo de anseio, medo, arrebatamento e
desespero, os jogos que jogamos, chegam aos ouvidos do diabo.
A fantasia salta adiante, atinge uma fúria
tempestuosa, então o inverno calmo no fim
Oh, A - Por Que Você Não Apareceu
Sozinho, agora em outro tempo me deito com doces
vestuários encantadores sobre pensamentos mais particular.
Cama de grama úmida primaveril, pura antes do sol, escravizada pelo controle, vento quente perfumando o ar, a luz do sol reluz em lágrimas em olhos tão profundos e límpidos.
Sozinho outra vez me pergunto por que você a número oito não foi.
Oh, A - Por Que Você Não Apareceu."

Anna Williams, após essa carta, foi embora para o Kansas.

Rader parecia consciente de que atormentava os medos mais profundos de mulheres. Afinal, mesmo hoje, perseguições e obsessões levam para destinos trágicos. A violência contra a mulher parece enraizada na mente de certos homens e, com ele, não foi diferente. Mesmo quando foi pego por um deslize incrivelmente banal, não mostrou arrependimento algum; pelo contrário, queria falar mais. E mais. Gostava do som da própria voz narrando por quanto tempo fizera a polícia de idiota e por quanto tempo seu nome permaneceu nos jornais. Aliás, na época, caso não publicassem determinadas cartas que ele pedia, sua ameaça era sempre uma nova vítima. Seu erro? Bom, o de vários na sua área. Acreditar que tinha formado uma relação de confiança com a polícia, que o jogo era mais importante do que sua captura. 

Durante o período onde o jogo entre ele, Wichita Eagle e a polícia permaneceram trocando informações, digamos que Dennis pensou ter formado uma ligação especial com os envolvidos. É um erro banal, cujo ego do assassino talvez não permita que ele perceba. Focado em manter tudo como um jogo e sem uma gota de remorso correndo em seu sangue, continuou trocando cartas e mais cartas, até cometer seu erro fatal. Ele mandou o seguinte recado para a polícia:

“Posso me comunicar por um disquete e não ser rastreado até um computador? Sejam sinceros.” 

O departamento que cuidava de seu caso disse que o rastreamento era impossível, é claro. Mas era possível. Eles descobriram a Igreja Luterana da qual o disquete havia sido enviado, e o mesmo, acredite se quiser, tinha o nome “Dennis”. Dali em diante, a caça começou e terminou com ele preso, sentenciado à vida na cadeia. O próprio Rader confessou dez assassinatos, deu detalhes sobre eles, e o julgamento teve início. A única peça que não se encaixava na época era o fato de ele não ter tido uma infância complicada, difícil. Em determinado momento alegou ter um demônio, um fator que o compelia. Porém, mais tarde, com um psicólogo do governo, Rader comentou sobre sua motivação:

“Não acho que eu estava mesmo atrás da pessoa, acho que era um sonho. Sei que não é uma coisa muito legal para falar sobre uma pessoa, mas elas eram basicamente um objeto. E eu tinha mais satisfação me preparando para aquilo e com o que vinha a seguir do que enquanto matava a pessoa.”

Na contramão, alguns psicólogos na época diziam acreditar na versão dos detetives, de que não houvera abuso algum em sua infância, mas que deveria existir algo. Algo que o fez assim.

E aos que procuram um vestígio de arrependimento nos atos cometidos por ele, aqui fica um dos seus depoimentos mais sinceros e marcantes, feito no dia 27 de junho em 2005:

“Estou me sentindo muito bem. É como se um fardo enorme tivesse sido retirado dos meus ombros. Por outro lado, me sinto como se fosse… Como se fosse um astro agora.”

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Nathália Morais
Pernambucana com o sertão nas veias. Apaixonada por fantasia, true crime e escrever mundos.

Comentários

  1. Um texto lindo, mesmo para quem não conhecia a história de B.T.K acaba envolvendo-se e querendo algo mais...

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  2. Nossa, não conhecia esse serial killer! Fiquei interessada em ler o livro. Acho esses temas aterrorizantes; como você disse, há sempre essa curiosidade pelo macabro.

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