Há muito tempo, num planeta Terra muito distante... Durante o pós-Primeira Guerra Mundial e a ascensão do nazismo e fascismo na Europa, era publicado pela primeira vez em 1937 o livro O Hobbit - Lá e de volta outra vez. Desde então, o livro recebeu várias edições, vendeu milhões de cópias e até o próprio autor, J.R.R. Tolkien, já modificou passagens para a então publicação de O Senhor dos Anéis.
Uma das coisas muito importantes de saber ao ler uma obra tolkieniana, muito mais do que "a história da Terra Média gira em torno das suas linguagens", que imagino que muitos já saibam hoje em dia, é algo comentado no livro Árvore e folha: um dos elementos considerados mais relevantes nos contos de fadas é o lugar. O reino encantado, a floresta amaldiçoada, a Terra Média. Segundo Tolkien, a narrativa não se prende às espécies das personagens, mas sim ao local: belo, cativante, mágico e simultaneamente perigoso e desafiador.
E é exatamente em O Hobbit que conhecemos esse lugar incrível, mágico, cativante, profundo, às vezes bizarro e assustador, da Terra Média pela primeira vez. E desde o início ficamos completamente imersos nos locais dessa Terra e seus peculiares habitantes. Passando pelos capítulos e suas aventuras, descobrimos novos lugares, personagens e raças neles. E muito se é capaz de deduzir sobre um povo e personagens nesses contos pelo local habitado por eles.
Contado em episódios, O Hobbit funciona como um livro de fábulas que você leria para seu filho toda noite antes de dormir: a cada capítulo temos uma nova aventura, seja com o nosso protagonista, o simples e sincero Bilbo Bolseiro, aprendendo algo novo, conseguindo alguma coisa, ganhando reputação, perdendo algo, e assim por diante. Logo, a proposta do livro seria como a de um conto de fadas da Terra Média: uma história simples sobre um protagonista igualmente simples sendo chamado à aventura para ajudar um povo a recuperar seu lar e, após o fim dessa jornada, voltar para sua própria casa (está aí o subtítulo: lá e de volta outra vez).
Então, desde sua premissa, seu título e o estilo de vida levado pelo Bilbo, o livro é marcado pela simplicidade e leveza de tom. Ele nunca chega a tocar assuntos muito pesados e nem possui momentos mais sombrios, como O Senhor dos Anéis, até porque o público-alvo é diferente (as crianças de Tolkien já tinham crescido na época da saga do anel). E é exatamente por isso que funciona tão bem.
J. R. R. Tolkien |
O Hobbit foi para muitas pessoas o primeiro contato com a escrita de Tolkien. Ele não tem uma descrição tão densa da natureza como em outras obras do autor, porém ainda conta com muitas descrições e consegue passar a sensação de se estar presente nos lugares da Terra Média tão bem quanto em qualquer um de seus livros. Bilbo é um protagonista querido e cativante, como Frodo, Sam e Aragorn.
Bilbo Bolseiro é, como muitos hobbits, um homem caseiro e quieto. Ele gosta da vida simples e calma que leva e aprecia as coisas mais mundanas. Mas nosso querido herói também se prendia demais em casa e não se permitia viver coisas fora dela, e é aí que começa sua jornada de herói: o chamado para a aventura. Nesse caso temos literalmente um mago, Gandalf, trazendo a missão até ele: ajudar Thorin Escudo-de-Carvalho e sua companhia de anões a recuperar Erebor, sua terra natal, do temível dragão Smaug.
A partir daí é história. Bilbo acaba indo com a companhia, que encontra obstáculos no caminho: trolls, orques, wargs, aranhas gigantes, os elfos da floresta, Gollum etc. Nosso herói, por fim, acaba achando sua coragem e seu papel na história e, vale notar, sem jamais perder sua essência simples, assim como a própria narrativa também não a perde. O Hobbit jamais foi pensado como o antecessor de O Senhor dos Anéis (aliás, O Silmarillion serve muito melhor para o papel do que esse livro). E não é justa a comparação de um modesto livro de aventuras com uma complexa história da luta de vários povos contra as forças do mal presente na trilogia do anel.
É possível apreciar os tempos mais calmos da Terra Média nessa história, as lições sobre encontrar sua coragem, e apreciar as coisas mais simples e honestas da vida. E, acima de tudo, assim como Bilbo Bolseiro, nunca deixar de pensar por si próprio, mesmo em frente a desafios tão grandes quanto derrotar um dragão. Nem, como Bilbo aprendeu, perder sua oportunidade de ter sua própria aventura um dia, afinal:
"O mundo não está em seus livros e mapas. Ele está lá fora."
Arte em destaque: Caroline Cecin
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