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Ascensão e queda de Graça Aranha


Diplomata, magistrado e escritor, nascido no Maranhão e consagrado queridinho e cofundador da Academia Brasileira de Letras (ABL), José Pereira da Graça Aranha, mais conhecido como Graça Aranha, é um grande nome da literatura brasileira com uma história um pouco conturbada com seus contemporâneos artistas.

Em 1897, ainda sem ter publicado seu primeiro romance, Graça Aranha participa da fundação da ABL, com Machado de Assis já aclamado presidente dela na época. Ele então ocupava a 38ª cadeira. 

Graça Aranha, formado em direito, utiliza-se dessa vivência para cinco anos depois publicar seu primeiro e mais famoso romance, Canaã. Ao longo de sua carreira, ele não publica muitos livros e parece até então acompanhar a linha pré-modernista de seguir um pensamento mais europeu, muitas vezes acompanhando o movimento artístico do Velho Continente ao utilizar suas estéticas ou temáticas etc. 

Quando a então Semana de Arte Moderna de 1922 ocorreu, Graça Aranha foi o único intelectual pré-modernista a romper com os ideias academicistas dos tradicionais autores da ABL. Ele não só foi um dos patrocinadores financeiros e organizadores (tendo sido responsável por convidar também nomes como Paulo Prado, Ronald de Carvalho e Heitor Villa-Lobos), como também fez, por reconhecimento de seu prestígio à Semana, a conferência de abertura da mesma: o ensaio “A emoção estética na arte moderna”

“Para muitos de vós a curiosa e sugestiva exposição que gloriosamente inauguramos hoje, é uma aglomeração de 'horrores'. Aquele Gênio supliciado, aquele homem amarelo, aquele carnaval alucinante, aquela paisagem invertida se não são jogos da fantasia de artistas zombeteiros, são seguramente desvairadas interpretações da natureza e da vida. Não está terminado o vosso espanto. Outros 'horrores' vos esperam. Daqui a pouco, juntando-se a esta coleção de disparates, uma poesia liberta, uma música extravagante, mas transcendente, virão revoltar aqueles que reagem movidos pelas forças do Passado. Para estes retardatários a arte ainda é o Belo.”

(Trecho da conferência de Aranha na abertura da Semana de Arte Moderna)

Após a Semana, Graça Aranha torna-se um dos “líderes” do movimento renovador da literatura, procurando uma arte brasileira com mais brasilidades e finalmente rompendo com o eruditismo europeu dos intelectuais da época. Em 1924, Graça Aranha faz uma conferência na ABL intitulada O Espírito Moderno, na qual afirma que a fundação da Academia foi um erro e um equívoco, pois as ideias academicistas dela eram rígidas e inflexíveis, não mudando, não se adaptando aos novos tempos e às novas vanguardas. O escritor continua: “Se a Academia se desvia desse movimento regenerador, se a Academia não se renova, morra a Academia”

Após suas polêmicas falas na ABL, Aranha recebe logo em seguida uma resposta do romancista Coelho Neto chamando seu brasileirismo de europeu, ou, em suas palavras:

“O brasileirismo de Graça Aranha, sem uma única manifestação em quaisquer das grandes campanhas libertadoras da nossa nacionalidade, é um brasileirismo europeu, copiado do que o conferente viu em sua carreira diplomática, apregoado como uma contradição à sua própria obra.”

Em outubro do mesmo ano, Graça Aranha comunicou seu desligamento da Academia por ter tido seu projeto de renovação recusado pelos academicistas, no qual ele elabora: “A Academia Brasileira morreu para mim, como também não existe para o pensamento e para a vida atual do Brasil. Se fui incoerente aí entrando e permanecendo, separo-me da Academia pela coerência”.

O acadêmico Afonso Celso tentou, ainda em dezembro de 1924, promover o retorno do escritor para a instituição, momento a que Aranha agradeceu o convite e reafirmou que seu afastamento da Academia era definitivo e que se afastou de seus colegas sem ressentimentos.

Aranha tenta se modernizar


Em meados de 1929, ele publica um livro intitulado A Viagem Maravilhosa, no qual coloca finalmente em prática seu projeto modernista de renovação da literatura. O livro traz paisagens cariocas, festas populares, relações entre negros, brancos e mestiços, e seu texto dialoga principalmente com as obras de Balzac, Goethe e Nietzsche.

Graça Aranha

Seu romance contudo, recebeu opiniões bem mistas entre a crítica, entre louvores e ataques. Muitos modernistas de forma geral criticaram negativamente o texto. E sem o apoio de nenhum grupo, fossem os eruditos, fossem os rebeldes modernista, não só essa, como a maior parte das obras de Graça Aranha fora Canaã, foram esquecidas pelo tempo, ou pelo menos não tão reconhecidas quanto as obras de seus contemporâneos. 

Aranha, mesmo ao tentar se revolucionar, se inteirar do modernismo, construindo cenários e imaginários brasileiros e valorizando as mitologias e naturezas do Brasil, não conseguiu chegar totalmente na tal estética. Sua obra ainda seguia o padrão de seus outros escritos: ser uma forma de divulgar sua filosofia particular, mantendo-se antenada com as vanguardas e com o modernismo.

De forma geral, o autor é referido em textos de Mário e Oswald de Andrade, por exemplo, apenas por emprestar o nome e o prestigio ao movimento e à Semana de Arte Moderna, sem o destaque para sua influência e produção.

E dizem as más línguas que Graça Aranha rompeu com o grupo modernista por ter sido, segundo seu julgamento, largado de segundo plano. O que, levando em consideração a falta de menção de seus romances e artigos por seus colegas, ele não parece ter julgado mal. Outro fator que ele levou em consideração para sua saída da bandinha modernista é não ter tido seu artigo publicado na revista modernista Estética. Aranha se sentia então como aquele membro da banda que teve papel crucial na sua criação mas jamais teve seu devido reconhecimento, o famoso membro esquecido, o membro que sai depois de um tempo e depois as pessoas tem até dificuldade de lembrar que ele fez mesmo parte daquilo.

Graça Aranha, logo, tende a viver nas nossas memórias como um artista que não está nem cá nem lá. Ele não é exatamente um modernista, nem um academicista, suas obras não são totalmente europeias nem brasileiras. Participa da fundação da ABL, rompe com ela, participa da Semana Arte Moderna, mas também não se encaixa exatamente com os outros modernistas.

E nessa dança de cadeiras, acabou pertencendo a todos esses grupos intelectuais, renovadores, e ao mesmo tempo, talvez, a nenhum deles.

Nicole Hildebrand
2000, carioca de nascença e de coração para sempre (mesmo fora de lá). Universitária cansada. Fã de carteirinha de fantasia e sci-fi desde pequena e sempre fascinada por boas histórias, independente de gênero. Escreve umas coisas por aí nas horas vagas.

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