"Uma trama sobre a fatalidade da existência humana."
Luz em Agosto é um romance de William Faulkner publicado em 1932, e tem um caráter mais acessível do que romances do autor como O Som e a Fúria, a trama se desenvolve com mais ação e não se concentra mais tanto nos monólogos interiores que davam origem ao chamado fluxo de consciência.
A mesma prosa caudalosa, no entanto, aparece neste romance e temos novamente o Sul dos Estados Unidos e um cenário de decadência moral e econômica. A narrativa mais simples, em comparação aos trechos intrincados da leitura de um O Som e a Fúria, por exemplo, não furta este romance, Luz em Agosto, de apresentar uma complexidade ligada ao grande número de seus personagens.
Portanto, uma vez colocado este universo que revela uma miríade de personagens, temos entre eles tramas e acontecimentos que se entrechocam, produzem consequências diversas e que apresentam histórias que podem tanto se completar entre si, como uma perspectiva corrigir a outra. E o cenário aqui é a cidade de Jefferson, no fictício condado de Yoknapatawpha.
Os centros gravitacionais do romance se compõem por três párias que são a adolescente Lena Grove, que está grávida, diante da fuga do pai da criança, o reverendo Gail Hightower e o forasteiro Joe Christmas. Este último é um branco que acredita ter sangue negro.
E aqui se desenrola uma narrativa não-linear, polifônica, que passa por um Joe Christmas em busca de sua identidade e sendo humilhado pela intolerância racial e pela violência do sul dos Estados Unidos dos anos 1930, em plena vigência da lei seca. Vemos esta sua luta contra toda a intempérie e o destempero puritanista que o condena fatalmente ao fogo do inferno, o juízo moral lhe consome a alma e a reputação.
Lena Grove vem do Mississipi, também no condado de Yokanapatawpha, em busca do pai de sua criança que iria nascer, e o reverendo Hightower é um tipo de pária moral acusado de ter sido responsável pela morte de sua esposa adúltera. Um destino trágico aguarda Joe Christmas, e as desventuras existenciais mais uma vez dominam o clima neste sétimo romance da obra de William Faulkner.
O tema do puritanismo norte-americano aparece, então, em Luz em Agosto, com tintas fortíssimas, toda a hipocrisia moral que condena e mata, e que elege seus párias, os jogando num destino trágico, está aqui condensada e retratada. Junto com o romance A Montanha Mágica, de Thomas Mann, existe aqui uma visão cósmica sobre o puritanismo. Aqui, um tipo de cosmologia que deixa a Deus a escolha de jogar os homens e as mulheres diante de seus próprios desafios e tragédias.
A perseguição a Joe Christmas por um assassinato, e logo depois por sua negritude, insufla e mesmeriza a comunidade de Yokanapatawpha, este tem um assecla de nome Brown, o mesmo que engravidou a errática jovem Lena Grove. Brown vira delator de Joe Christmas e sela o destino deste. A sanha moralista e puritanista ganha ares de loucura inquisitória e Joe Christmas já não teria defesas espirituais para suportar e mudar a rota de sua tragédia pessoal.
Lena Grove segue obstinada em sua busca. Brown, que era Lucas Burch, não pretendia cumprir com suas obrigações, e a trama de busca de Lena Grove ganha tonalidades de absurdo da existência. Lena, por fim, confunde Byron Bunch com o seu Lucas Burch, e sua busca se torna caótica. Mas este se apaixona por Lena e a coloca, no entanto, de volta na pista de Brown, o verdadeiro Lucas Burch.
William Faulkner cria neste romance uma riqueza de situações e um número considerável de personagens que agem o tempo todo e dialogam entre si. A prosa aqui se desenvolve e se expande com uma desenvoltura da narrativa do autor, ele ganha uma fluência que coloca Luz em Agosto tanto como uma trama de ação, como um romance cosmológico sobre o puritanismo sulista norte-americano.
Portanto, temos também, no romance Luz em Agosto, este fundo cosmológico de pessimismo religioso, de estar narrando uma trama sobre a fatalidade da existência humana, deste regionalismo sulista que é desolador e que conta as desventuras de seus personagens, com fatos que emergem e que podem ser interpostos, revelando uma suposta voz deste povo do sul norte-americano. Luz em Agosto, por fim, tem um mérito apenas comparável ao seu sucessor, o romance Absalão! Absalão!, este que seria publicado quatro anos depois, no ano de 1936.
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Arte em destaque: Sofia Lungui
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